sexta-feira, 27 de junho de 2008

Mugabe e os aspiradores


Mugabe é um tirano, Mugabe massacra o seu próprio povo, Mugabe é responsável pela situação económica desastrosa daquele que foi em tempos considerado o “celeiro de África”… Tudo isto são factos! Mas também é um facto que Mugabe sabe fazer uma campanha eleitoral eficiente.

A sua principal mensagem é simples, directa e eficiente: “Ou votas em mim ou morres!”.

Não imagino motivo mais convincente para se votar em alguém do que este. Acho que, perante isto, poucos são os que se arriscam não votar em Mugabe. É que, ainda por cima, o homem cumpre as suas promessas! Não é cá como os nossos políticos… Se o Sócrates me viesse com este argumento eu apenas respondia: “Pois, pois… tal como baixaste os impostos…”.

Imaginemos a seguinte conversa entre os responsáveis da campanha de Mugabe:

- Então que mensagem é que queremos passar?

- E que tal: “Vota Mugabe! Criaremos 150 000 novos empregos!”

- Ah! Ah! Com esse argumento só estaríamos a fazer o nosso líder passar por mentiroso… Nós queremos passar a imagem de que Mugabe é credível…

- Pois… E que tal se passássemos a mensagem de que vamos baixar a inflação? Não é difícil… Se baixássemos de 1.000.000 % para 999.999 % já estaríamos a fazer qualquer coisinha…

- Mas tu és maluco? Não vamos dar falsas esperanças às pessoas… Temos que lhes dar algo em que elas se possam acreditar, temos que lhes provocar emoções fortes, temos que lhes fazer sentir que têm obrigatoriamente que votar em Mugabe… Temos que criar o nosso próprio “Yes, we can!”…

- Pois… E que tal “Vota Mugabe! Mugabe não é canibal”?

- É uma boa ideia… Mas não vamos mentir às pessoas…

- Espera aí! Tive uma ideia! E que tal: “Vota Mugabe, senão morres!”. Não é impossível de cumprir, é uma mensagem simples e vai fazer-nos ganhar muitos votos… De facto, apelarmos ao instinto básico de sobrevivência das pessoas elas não têm outra hipótese… A vitória é garantida!

- Porreiro, pá!


De facto usar a morte para vender produtos é imbatível. Eu quero lá saber dos 150.000 empregos, eu quero é que me deixem viver!

O engraçado é que este tipo de tácticas também é aplicável no campo não político. A Nike podia fazer o anúncio mais espectacular do Mundo, se a Adidas nos dissesse que morríamos se não comprássemos os seus produtos não tínhamos hipótese…

Imaginem os seguintes slogans e vejam se não vos faziam ir correr para o supermercado:

“Se queres viver usa Pasta Medicinal Couto”

“Compra Bacalhau Pascoal ou levas um tiro nos cornos”

“Salsichas Nobre: se não as comeres… Morres!”

“Vodafone: se não usares os nossos telemóveis, bem que podes ir ver se apanhas rede debaixo da terra…”

“Se não quer que o seu bebé conheça o Criador antes de começar a andar, compre-lhe fraldas Dodot… Já!”

“Coca-cola: E se o menino quer continuar a viver, tem de beber este copo até ao fim… e vai acima e vai abaixo e vai ao centro…”

“Brise: Gostas de respirar, não gostas?”

“Mercedes: Ou compras um ou és atropelado por um, agora escolhe…”

“Óleo de fígado de bacalhau: Aqui o que interessa não é se gostas ou não, é se queres viver ou não…”

“Evax: Sentes-te viva, sentes-te bem!”

“Super Bock: Não beber Super Bock mata!”


Bem, acho que já estou a exagerar um bocado… Já devem ter percebido a ideia… Contudo a sua eficiência não é um dado adquirido. Não basta insinuar, há que cumprir. Para isto funcionar teria que haver uma forte ideia de uma morte iminente. Não é como o tabaco em que as pessoas lêem que o tabaco mata e ainda se dão ao luxo de continuar a fumar: “Olha para mim a fumar, não morro, pois não? Ah! Ah! Ah! Lá vai mais um prego para o meu caixão...”. Se houvesse um sniper escondido a alvejar todos aqueles que sacassem do seu cigarrinho queria ver se continuavam a fumar… Acabava-se com esse flagelo do tabagismo... Acho que a essência da campanha de Mugabe está aí… É que se não votas nele, podes morrer mesmo… O único problema é que se votares, é muito provável que também acabes por morrer…

Para finalizar, devo admitir que, há bem pouco tempo, usaram este argumento comigo. Passo a contar a estória. Veio um senhor cá a casa fazer uma demonstração de uns aspiradores XPTO. Sem qualquer compromisso, até lhe estávamos a fazer um favor ao deixá-lo fazer a sua apresentação… Para nós foi perfeito, para além de ajudarmos o homem, não conseguíamos imaginar um programa mais fascinante do que passar duas horas a ouvir falar de aspiradores…

Fiquei espantado com a capacidade do objecto. Era, de facto, fantástico e fiquei a saber que o local onde habito é pouco diferente de uma pocilga e, também, que partilho a cama com uma civilização de ácaros (é incrível, os bichos conseguiram-me levar para a cama e nem “Amo-te” disseram… Nem sequer uma prendinha, nem um jantar à luz das velas… Nada! Senti-me um bocado violado…) Isto para a minha mãe foi um grande choque, mas não é o suficiente para desembolsar 2500 euros num aspirador… Ok! Está sujo, mas nem sequer se vê… Não basta isso para nos fazerem estoirar 2500 euros… Foi o argumento final do homem que quase nos convenceu a hipotecar a casa (a nossa imunda habitação) para adquirir a tal engenhoca. É que o senhor, com toda a naturalidade de quem invade a casa de um estranho, depois de discorrer durante duas horas sobre as qualidades de um aspirador, fez questão de nos dizer que ao optarmos por não comprar o dito aspirador, estávamos a correr risco de vida. Íamos acabar por ser vítimas de homicídio dos nossos amiguinhos microscópicos (não lhes chega meterem-se na nossa cama e no nosso sofá contra a nossa vontade, ainda querem matar-nos). Esteve quase, quase, quase a convencer-nos… Se ele se tivesse feito acompanhar de um ácaro armado de metralhadora era muito provável que o tivesse conseguido…

8 comentários:

reb disse...

lol, acabei de postar sobre o mugabe, vim espreitar o teu blog e vejo q tb o homenageaste :)

antes de ler o teu texto( como sempre muito bem escrito) pensei que o comparavas a um aspirador, por sugar tudo do seu povo :)

idadedapedra disse...

bolas, woody, tu és o meu herói!!! Qaulquer dia passo-te à categoria de sobrinho (é cá uma mania de que sentido de humor é uma questão de genes da minha família)!
Escreves com um sentido de humor que me deixa escaqueirada de rir, tens uma imaginação deliciosa.
Não sei que curso estás a tirar, mas devias ir para criativo de publicidade :)
Ora e eu, que até acho que tenho muito sentido de humor, fico sem palavras depois dos teus textos.

O gajo do aspirador conseguiu uma proeza comigo aqui há uns anos atrás (eu era jovem e por isso pouco experiente:); apanhou-me num dia em que tinha estado de urgência durante a noite e estava de rastos. Para ele se calar assinei a papelada.
Não me impressionou nada a quantidade de ácaros da minha cama porque no fundo gosto de dormir acompanhada. A parte que gostei foi a de ele encolher um cobertor tirando-lhe o ar escondido entre os pelos, o que me permitiu arrumá-lo muito mais facilmente.
Já não tenho esse aspirador (graças a deus foi-se com a separação dos bens). Odeio-os mesmo. Detestei usá-lo porque era enorme e era preciso estar sempre a mudar a água. Detestei-o porque andei a pagá-lo não sei quanto tempo.
Detesto tanto esses aspiradores como detesto os tiranos africanos.

Mas olha, ele (o tirano, não o aspirador) provavelmente até criará alguns postos de trabalho... os que morrem por não votar nele ou por qualquer outra catástrofe dessas, deviam estar a ocupar postos de trabalhos concerteza... pelo menos alguns deles... logo vagam o lugar a quem merece votando em quem deve :))

Woody disse...

É muito bom ler um elogio desses de alguém que tem um sentido de humor genético :) Muito obrigado mesmo!
Estou no último ano de Psicologia e sonho poder, um dia, viver da minha criatividade e/ou ter a minha própria livraria...
Ainda bem que me contaste essa história do aspirador é que eu, ainda hoje, sinto uma espécie de remorsos por não termos um em casa... É que o homem foi tão convincente com aquela questão de morrermos se não tivesses um aspirador daqueles que aquilo ainda hoje me atormenta... Até tenho um pesadelo recorrente em que sou atacado por um exército de ácaros e, no momento em que estou prestes a sucumbir ao seu feroz ataque, olho para o céu à espera do aspirador que me virá salvar, mas sempre com a certeza que este não virá apenas porque não gastei uns 2500 euritos (o preço da minha vida)... Estou a brincar, não tenho este sonho e nem penso muito nisso, mas achei piada à semelhança das técnicas de venda dos aspiradores com a campanha eleitoral de Mugabe... o que é bastante estúpido, diga-se de passagem...
Relativamente aos postos de trabalho acho que se o objectivo de Mugabe é esse, em vez de matar pessoas podia pô-las a vender aspiradores... Assim como assim (bela expressão), é capaz de ser um bocado melhor. Se bem que, com a inflacção no Zimbabwe, o único potencial comprador de um aspirador destes é mesmo Mugabe e não o estou a ver com disposição a assistir a 500 demonstrações todos os dias... Não me parece que esteja de acordo com o seu feitio. Acho que ele é mais do tipo de matar pessoas... O que ele faria imediatamente ao primeiro vendedor que lhe aparecesse à frente e ainda levava um aspirador à pala...
Parece-me que encontrei um aspecto positivo de viver no Zimbabwe: podem ter o Mugabe mas não têm vendedores de aspiradores...

idadedapedra disse...

ah, conquentão psicologia... isso é como a Maggie, minha sobrinha, (logo com o gene do humor bastante enraizado tb...)
Já espreitaste os devaneios dela na net?

Woody disse...

Por acaso não conheço... Qual é o link?

O bom humor é essencial para quem está a tirar psicologia... Acho que é a única maneira de lidar com as agruras da nossa classe. Quem tiver uma má atitude, está tramado...

Estou mesmo a acabar o cursoe e estou a entrar numa nova fase em que já começo a pensar mais naquilo que me espera (depois de 17 anos a estudar é uma grande revolução)... Ainda hoje tive uma entrevista de emprego em que fui tratado como se estivesse a fazer a inspecção militar... Se não tivesse sentido de humor e brincado com a situação tinha desesperado. Mas acabou por ser engraçado e, se não conseguir o emprego, ao menos diverti-me com a situação, ganhei uma história para contar na mesa do café e aprendi mais um bocadinho sobre a vida...

Acho que nunca tinha falado tanto sobre mim no blog (self disclosure, como se diz em psicologia, os meus professores haviam de ficar orgulhosos)...

idadedapedra disse...

o blog da maggie (filha da Reb):
http://www.loucura-de-devaneio.blogspot.com/

Boas entrevistas, carago! Isto não tá fácil para os psicólogos pq são mais cás mães!

Woody disse...

Engraçado :)! Não me tinha apercebido que fossem da mesma família! Nem sei como me poderia ter apercebido... De qualquer maneira, fiquei surpreendido...

Quanto às entrevistas, só agora é que estou a começar. De facto, não está fácil e haver quase 40 cursos neste país a vomitarem psicólogos todos os anos não tem ajudado muito. Apesar de tudo, a área onde estou (Psicologia do Trabalho) oferece uma maior empregabilidade do que as outras (as áreas consideradas mais tradicionais da Psicologia).

reb disse...

Ah, fizeste a vertente "psicologia das organizações"?
Sim, deves ter mais hipoteses de trabalho do que os clinicos...
A minha filha quer seguir "forense", embora eu ache que o mercado deve estar a ficar saturado...
Logo se vê...step by step :)

já apanhaste bolonha?