segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O Mundo encantado dos corruptos



Este blog interrompe a sua emissão habitual para falar um pouco sobre um assunto sério que anda a massacrar a cabeça ao seu autor, ou seja, eu.

Deixo aqui estas três notícias:

Ex-presidente de associação de estudantes processada por desvio de fundos (IOL)

Ex-presidente de associação de estudantes diz-se tranquila (Sol)

Controvérsia marca eleições na Faculdade de Letras do Porto (vídeo de notícia da RTP)

Segundo os resultados de uma auditoria externa entre má gestão e. possivelmente, corrupção a Associação de Estudantes da Faculdade de Letras da UP foi lesada nuns bons milhares de euros... Nada que me surpreenda, não só porque fui dirigente associativo mas porque a pessoa em questão é uma velha conhecida.

A propósito de um post em que assumi explicitamente o meu passado associativo discutiu-se a má imagem dos dirigentes associativos na sociedade e eu acabei por concordar que, de facto, essa imagem tem razão de ser. Estas notícias vêm comprovar isso mesmo. Por mais que lutemos, por muito que façamos, por mais coerentes que procuremos ser haverá sempre casos destes a manchar a reputação de quem leva o associativismo/voluntariado a sério.

Muito pior do que a destruição da imagem dos dirigentes associativos são as conclusões que podemos tirar deste tipo de coisas. Estou convencido que a minha (nossa) geração não vai contribuir com muito mais do que este tipo de escumalha para o desenvolvimento da sociedade. Não me estou a referir à menina da notícia, porque essa, em termos políticos já está queimada demais para ser mais do que Presidente da Junta. A sua inteligência também não lhe permite almejar voos mais altos (será uma bem sucedida empresária da noite e pouco mais, mas já nem digo nada)...

Se o Mundo não acabar entretanto por causa do aquecimento global ou por nos termos comido uns aos outros ou se Deus me der saudinha para chegar até lá, quando tiver 50 anos vou olhar para o passado e sentir vergonha da minha geração. Estamos a deixar para trás as pessoas com valor, em detrimento dos graxistas, dos lambe-botas e dos corruptos. A bajulação é valorizada em detrimento da coragem, da rebeldia e da genuinidade. Somos uma geração de meninos das jotas que nunca fizeram nada pela vida e que através de falinhas mansas, facadas nas costas e favores mais ou menos lícitos conseguiram subir por aí fora até se tornarem "cidadãos respeitáveis". Cidadãos que vão ter assento nos Conselhos de Administração das empresas e estabelecer contacto com as mais altas individualidades, desde o Presidente dos EUA, passando pelo papa, até à Máfia Napolitana. São esses meninos que vão conseguir ter tanto dinheiro que vão comprar a sua própria justiça, como quem vai ao Supermercado comprar latas de atum. São esses meninos que vão subindo uma escada de favores de outros meninos, num esquema pirâmide em que a base somos todos nós. São esses meninos que vão premiar outros meninos como eles e perpetuar esta selecção natural, em que só o mais forte subsiste. Sendo que, neste caso, ser mais forte significa ter uma coluna vertebral que lhe permita aguentar com todo o tipo de falcatruas ou ter um sono tão pesado que lhes permita adormecer com o peso de que se está a contribuir para uma entropia acelerada do Mundo. Eles sabem-no bem, mas não lhes importa. Só eles interessam e, comparado com isso, o Mundo é muito pequeno.

Atiram-nos todos os dias areia para os olhos, alegando que vivemos num Estado de direito democrático. Permitem-nos escolher, de 4 em 4 anos, entre vários "líderes". Independentemente da maneira "democrática" como estes foram eleitos, quer esta tenha sido através de votos de militantes arranjados à pressa e a quem alguma alma mais voluntariosa pagou as quotas via Multibanco na véspera das eleições, quer este tenha sido através de umas eleições, previamente combinadas, em que o voto é feito de braço no ar.

Vivemos numa sociedade em que, se chamarmos as coisas pelos nomes, corremos o risco de levar com um processo em cima. Se chamar corrupto a um corrupto é difamação, chamar político a um corrupto é pleonasmo.

As pessoas com valor, inteligentes, com princípios, com uma vontade genuína de fazer alguma coisa acabam por se afastar com a certeza e a frustração de que isso é algo impossível. Este sistema acaba por transformar aqueles que têm valor em pessoas frustradas, revoltadas e alienadas.

E é a esses que eu apelo. Temos que nos mexer. Sendo cidadãos activos e com impacto dentro da nossa comunidade ou do nosso emprego. Sendo sempre coerentes e não compactuando com coisas em que não acreditamos, por muitos dissabores que isso nos traga (e normalmente traz muitos). Cultivando-nos intelectualmente e emocionalmente, tornando-nos assim mais cultos e mais fortes para lidar melhor com a mediocridade que vai estar acima de nós e para defender os direitos de quem está abaixo e que não tem as mesmas oportunidades que nós.

Aos bocadinhos conseguimos mudar alguma coisa. Não podemos é ser coniventes com as tretas que nos impingem todos os dias: "Ele roubou? Claro... Toda a gente faz, ele é só mais um..." ou "Eu não vou votar porque eles são todos iguais e não acredito que mude alguma coisa". Irrita-me que haja pessoas que se acomodam na evidência de que isto está mau e que dificilmente vai mudar. Todo este sistema vive desta atitude, desta passividade destrutiva. Independentemente da sua cor, cada deputado que entre na Assembleia da República com o espírito de missão e o orgulho de que se está a contribuir para a construção de uma sociedade mais justa, é um tiro neste sistema corrupto. O mal dos nossos políticos é que o nosso bem-estar é a última das suas prioridades. Um cargo na Comissão Europeia, um tacho no Conselho de Administração de uma empresa pública ou o cargo de CEO de uma empresa com que se negociou enquanto se esteve no poleiro estão bem à frente do nosso bem-estar na lista de prioridades dos nossos políticos.

Apesar de ser difícil, temos a obrigação de ser tolerantes com quem pensa de maneira diferente e aproveitar essa divergência saudável para fins construtivos. As opiniões diferentes não nos devem separar porque se estivermos a lutar para o mesmo fim, as nossas diferenças só nos vão enriquecer. Aquilo que nos deve separar de alguém é o desrespeito pelo princípio ético universal que nos guia e que é (ou devia ser) o pilar da nossa sociedade: a liberdade. A liberdade pressupõe o respeito pelos outros, a igualdade de direitos, a justiça... Será que somos livres hoje em dia? Ou a liberdade não passa de uma palavra bonita escrita num livro que ninguém respeita?

Para sermos verdadeiramente livres não podemos permitir que nos desrespeitem. E o desrespeito não é uma piada, uma boca ou um comentário desagradável. Desrespeito é quando, deliberadamente pisam os nossos princípios e tudo aquilo em que acreditamos à nossa frente. Não reagir a isso é entrar em incoerência. É ser conivente com essas atitudes, é deixarmos de ser nós próprios.

Acho que todos já passámos por isso. Eu já, pelo menos. E é das piores sensações que existem, já que, inevitavelmente, odiamo-nos a nós próprios. Temos é que aproveitar esse mal-estar para nos tornarmos pessoas melhores, porque sentirmo-nos mal com as nossas incoerências, é a prova de que ainda sentimos. É uma mensagem da nossa consciência a dizer-nos que não estamos a agir bem. É o sistema de segurança que nos permite avançar como Homens. A partir do momento em que deixamos de nos sentir mal é porque vendemos a alma. É sinal de que nos acomodámos aos "benefícios" de engolir sapos. É sinal que nos transformámos numa das rodas dentadas deste relógio distorcido, que avança apenas para destruir tudo o que nos rodeia.

Neste momento não tenho grandes esperanças na minha geração. Conheço muita gente que pode fazer a diferença. Espero que encontrem um furo no sistema que lhes permita superar os meninos das jotas. Ou então, que o sistema se auto-regule e, de um momento para o outro, tome consciência que assim não vamos a lado nenhum...

E foi um desabafo... Normalmente sou mais optimista, mas estou mesmo fodido...

11 comentários:

Anónimo disse...

Pardon my french mas... FODA-SE, que coisa tão bem escrita! Transcrição perfeita dos teus pensamentos e sentimentos (que, já agora, são partilhados por mim, e acredito que por muitos outros). Não ficou absolutamente nada por dizer.

Passando a adulação à frente, podes ser estúpido à vontade, mas kizomba é que não! Isto é muito mau. E quem é esta afinal? Sim, é a Raquel, mas com K, que tem muito mais classe. Mas é quem? E onde a foste desencantar, q isso é q é assustador?

Tiago Pinto disse...

o meu comentário poderia ser apenas: desencanto partilhado! Ao contrário do cântico dos diabos vermelhos (cada vez seremos mais), nós aqui, cada vez seremos menos...

foi o mundo associativo - entre outras coisas - que me fez acreditar que Portugal está bem mais perto de àfrica do que da restante europa, se é que me faço entender...

é dificil alguma notícia em relação ao associativismo, às gestões danosas e criminosas me surpreender...nós vimos de tudo, rapaz!!!

como é possível alguém com quase 30 anos querer perpetuar-se na representação de estudantes? quando nem eles próprios são estudantes...

vamos mas é embora, rapaz...

abraços

Tiago Pinto

Anónimo disse...

De facto a nossa geração deixa-se corromper com uma facilidade que impressiona até o líder máximo da máfia russa. Não há valores que resistam, "baixa-se as calças" sem ninguém pedir, é uma cambada jeitosa esta!
O que receio é que eu já esteja do lado daqueles em que a frustração se apoderou de nós perante esta máquina de compadrio ou a chamada ´Instituição cunha´!
Os valores que sustentam e edificam o carácter de cada um são rapidamente trocados por uns trocos (que poderão ser uns valentes trocos) ou por uma promoção vitalícia. Mas, como podem estes tipos... eles não tem consciência? Será que eles não pensam durante 3 segundos que sejam, nas pessoas competentes e integras que ficaram para trás só porque não se aliaram à máquina (ou porque não nasceram com eles virados para a lua)? Eh pah, estas pessoas não pensam, pagam e corrompem para alguém pensar por eles...

E o que me chateia é que quando queremos mudar alguma coisa, há tipos com idade para serem nossos avôs e não para andarem no associativismo, em que preferem nada mudar porque isso para além de dar muito jeito para a típica promoção política que perpetuam durante estes anos, também dá para desviar algum que seja (e imagino que aos anos em que alguns já lá andam... este algum não é nada pequeno)! Que sanguessugas, retirem-se! Vão é constituir família (já é bem tempo) e deixo o associativismo para os verdadeiros ´estudantes´! Vontade de mudar a estes não falta!

Lu.a disse...

Bem, da tua geração não sei, mas eu cá orgulho-me da minha...também há uns "montes de merda" corruptos, mas isso agora não interessa nada.
Quanto ao kizomba...meu deus!! Valeu pelo que me ri, a letra é de uma genialidade estonteante, lol!

S* disse...

Muito, muito bem escrito. Parabens Woody! :D

Eu faço parte da comunidade FLUP, e fico chocada com casos como os que referiste. Nunca fui dirigente associativa, nem pretendo ser. Mas respeito ao máximo quem se dedica a esse "trabalho".

Anónimo disse...

Subscrevo o teu manifesto, como deves supor, por inteiro. Parece-me evidente, cada dia mais, de que o "business as usual" prevalece. Não, não estamos a emitir dramaticamente menos emissões de CO2 do que estávamos quando Al Gore editou aquele "sustentáculo" da revolução verde. Não, não caminhamos para mudanças de paradigma social e económico: A Nova Ordem Mundial resume-se à estabilização de todos os sistemas que contribuiram para esta rotação acelerada da Terra no seu eixo.
Estabilidade... Não prevejo muito disso no Globo, por isso não vás Tiago, fica e junta-te ao movimento:) Também quero afastar a inércia... Partilhamos princípios que nos obrigam, que nos fazem querer retribuir e extender o privilégio de estarmos tão preparados quanto aqueles outros "meninos" (sem todos aqueles defeitos :). Sei em que lado estou. E não somos assim tão poucos...

PS: Depois disto, que me toca a alma, vi aquilo, que me toca o corpo todo. Sempre disse que ela podia ter todo o sucesso, mesmo com o défice de "percebas" (linguagem técnica de psi), o beco a fazer lembrar uma picareta, e aquele fófófó lúcido como um poste se... Pois é... Tás a adivinhar... Vês as duas grandes diferenças? Hei-de por umas iguais aquelas, para ver se sou alguém na vida.

Woody disse...

Tiago

É verdade que vimos de tudo… E só não vimos mais por causa da nossa ingenuidade… Já sabes que, por mim, vou-me embora daqui. Mas és a minha referência no que diz respeito a fazer o que é correcto, por isso não desistas! Se desistires não sei o que é que podemos fazer...

Abraço

Daniel

Assusta-me que esses avozinhos continuem a ganhar eleições e a terem relações tu-cá-tu-lá com ministros... É de duvidar das intenções de alguém que faz questão de ser estudante tanto tempo...

Concordo plenamente com o que disseste!

Lu.a

O que disse aplica-se tanto à minha geração como à “tua” (não és assim tão mais velha do que eu :p). A minha geração tem muito valor e eu tenho orgulho dela… Simplesmente acho que as coisas estão montadas de maneira a que só a “escumalha” se saliente...

A letra da música é muito profunda... Tenho-a tatuada nas costas :p


Sanxeri

Obrigado :)

É um trabalho respeitável mas sem a constante participação dos estudantes pode ser desvirtuado...


Daniel

Concordo com o que dizes… Apesar de podermos discordar nalguns detalhes, no essencial estamos completamente de acordo! A consciência de que estamos certos é meio caminho andado para conseguir fazer alguma coisa... Se não conseguirmos, pelo menos teremos a certeza de que tentámos...

Duas daquelas são garantia de sucesso pessoal, profissional e moral :p

Tiago Pinto disse...

o comentário do sérgio ao meu deixou-me enternecido... :)

mais a sério e misturando a minha grande paixão, o futebol. aqui há dias ouvi um jornalista que acompanhou desde início o processo apito dourado e leu todas as escutas e quando lhe perguntaram o que mais o marcou ele disse o seguinte:

- "a facilidade com que as pessoas de deixam corromper, um dia ouvi uma escuta onde um árbitro se deixou corromper por um par de sapatos"

Passei horas a fio a falar destas coisas com o sérgio - e passarei muitas mais ainda - mas bolas, isto está tão enraizado que nós é que passamos por parvos. Lembro-me, voltando ao associativismo, quando eu e o sérgio organizamos uma daquelas festas onde todos ficavam KO e nós e mais um grupo de "tonos" arrumavam tudo, empurravam bebedos, etc... nessa festa, como é óbvio, o pouco que bebemos, pagamos! Tipo, é normal, eu bebo, eu pago...quando falamos disto ao mais variado pessoal eles riam-se na nossa cara e parecíamos extra-terrestres...

Mais um pequeno exemplo; na minha escola estava a organizar uma dinâmica com uma turma baseada na entreajuda e solidariedade, cujo objectivo era andar com um livro na cabeça e quem deixasse cair tinha de se sentar no chão e esperar que alguém - com o livro na cabeça - o fosse ajudar. quem ajudasse, demonstrando solidariedade e arriscando ficar no chão também ao ajudar o outro ganhava um ponto...era uma turma do 7º ano, sabem o que aconteceu 10 minutos depois de iniciarmos o jogo? havia miúdos a darem encontrões aos outros para depois os conseguirem ajudar e ganhar mais pontos...

desculpem o palavriado a mais...

abraços

Tiago Pinto

Lu.a disse...

Looooolll! Tens a letra tatuada nas costas ??! Tava a pensar fazer isso também, tatuar a parte "em silencio eu te gosto, em silencio eu te preciso" no meu braço esquerdo, mesmo por baixo do coração que diz "amor de mãe- Angola 1974" :P

Anónimo disse...

Tu tens colegas destas? És o meu herói! Gosto muito da moça! Qual o contacto para marcar um espectáculo privado? :P

Tenho de responder a algo que escreveste no Twitter: queres ver Hare Krishnas? Vai ao "Oriente no Porto", perto da Cadeia da Relação e vês uns quantos. Incluindo uma senhora que teve a infeliz ideia de chamar Govinda ao seu filho lol Mas a comida é muito boa.

Anónimo disse...

Este vídeo é daquelas coisas que, como dizer, é horrível but.can't.look.away! Entendes? Eu dava tudo para ver algumas colegas da faculdade a cantar (e dançar) kizomba. looool Isto é tão bom!